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15 de setembro de 2017

PARTITIVO NÃO É A MESMA COISA QUE POSVÉRBIO





 
Sempre ouço a CBN, “A RÁDIO QUE TOCA NOTÍCIA”, como diz, com precisão esclarecedora, seu slogan, muito bem idealizado. Gosto de sua programação e de seus quadros fixos, que tratam de política, finanças, artes e muitas outras formas de disseminar o conhecimento, de acordo com as cinco funções básicas da radiodifusão, que são a de informar, formar, divertir, prestar serviços e vender, não, necessariamente nessa ordem.
            O Presente comentário surgiu por eu ter ouvido nesta emissora, às 15h30min, do dia 15 de setembro, os comentários do Prof. Pasquale Cipro Neto sobre um caso de regência verbal. Um ouvinte perguntou ao mestre se, gramaticalmente, era correto o emprego de expressões do tipo “beber do vinho”, “comer do pão” e outras similares. O eminente professor foi às respostas, utilizando-se da letra da música de Chico Buarque de Holanda, Cálice (1973 – lançada 1978), destacando o verso: “Como beber dessa bebida amarga”. Sua resposta, como não podia deixar de ser, foi correta, mas insistiu em caracterizar esse fenômeno de regência verbal como um caso de PARTITIVO. Nós não usaríamos esse termo, ao explicar o fenômeno. Se não, vejamos:
“Partitivo”, em gramática, é a palavra que designa uma parte de um todo. Mas como isso funciona? Não existe uma única forma linguística que detenha, nela mesma, essa significação. Em outras palavras: o partitivo é o emprego de uma preposição relacionada a um verbo – um tipo de regência ocasional – modificando o sentido desse verbo, acrescentando-lhe algo além de seu significado conhecido. Por exemplo. A preposição DE em “COMI DO BOLO”. Comer o bolo significa ingerir um alimento, um doce, uma iguaria qualquer. Comer do bolo passa a significar comer parte daquele alimento; ou apenas um pedaço dele (ou comê-lo totalmente com muita vontade e prazer). Portanto, a preposição DE tem aí, nessa frase, um valor nocional, significativo, pois impõe novo significado à expressão, se compararmos a: COMI O BOLO. Isto é, a mesma expressão sem a preposição DE. Estamos diante de um caso de sintaxe de regência. Sabemos que há verbos que exigem complementos para sua total significação e esses complementos podem surgir com ou sem preposição. Esses complementos são os objetos direto e indireto. Bem, isso é conhecido de todos. O que, talvez, não seja muito conhecido é que esse fenômeno sintático recebeu o nome de POSVÉRBIO, dado por Antenor Nascentes. O partitivo existe, mas é diferente do posvérbio.
Em português, só é partitivo se a ideia introduzida pela preposição levar à noção de “parte”. Se eu quero dizer – sempre expressivamente - que parte do bolo foi comida, eu emprego “comi do bolo”. Da mesma forma, digo “beber do vinho”, se entender como “beber parte do vinho oferecido”, mas se ficar implícita a “necessidade indispensável da bebida”, como ficou no exemplo acima do “bolo”, cujo outro sentido foi colocado entre parênteses, talvez o termo PARTITIVO não possa ser empregado, por não estar verbalizada, na ação de beber, somente uma parte do líquido a ser sorvido. Evidente que há outros empregos verbais com outras preposições que não introduzem o sentido de PARTE, ou apresente oportunidades de mais de uma interpretação. Portanto, não é claro o nome PARTITIVO, nem seu uso é recomendável. Mas é inegável que o seu emprego é de uso expressivo na língua. É uma maneira conotativa de se expressar; é uma forma linguística que sensibiliza e chama atenção para a função poética da linguagem. Mas existe a forma abrangente para essas situações de linguagem expressiva no estudo da regência verbal, que nos foi dada pelo grande mestre Antenor Nascentes: é o POSVÉRBIO. Em português, é eminentemente uma forma expressiva, por se tratar de uma construção, onde se usa, depois de certos verbos, uma preposição que lhes modifica o sentido, acrescentando-lhes novo matiz, e não rege a palavra que serve de complemento a esses verbos. Essa preposição funcionará como verdadeiro MORFEMA (in, O problema da regência, Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1960, p.17). Vejamos alguns exemplos. A) Arrancar DA espada (acentua a ideia do uso da arma); B) Comer DO pão (acentua a presença indispensável do alimento); C) Cumprir COM o dever (acentua a ideia de obediência, de zelo); D) Perguntar POR alguém (denota curiosidade, interesse); Olhar PELA criança (acentua a carga afetiva, o cuidado). Antenor Nascentes mostra ainda que em inglês tal fato também ocorre. Exemplos: To go = ir; To go up = subir; To go dow = descer; To go in = entrar; To go out = sair (Idem, ibidem, p.16). Por outro lado, na gramática inglesa, o partitivo ocorre para indicar que um objeto é afetado apenas e parcialmente pelo verbo, não tendo efeito denotativo, real. Muitas vezes, corresponde às palavras "some”, alguns ou "any", qualquer. É semelhante, também, em muitos aspectos ao caso genitivo.
Portanto, devemos distinguir PARTITIVO de POSVÉRBIO. Em português se empregarmos o termo partitivo, podemos dizer que todo partitivo é um posvébio, mas nem todo posvébio é um partitivo, como ressaltam os exemplos dados.
Como sugestão aos meus leitores, creio que devemos aplicar a esses casos especiais e expressivos de regência, ou de regência expressiva, o termo POSVÉRBIO e não partitivo, menos por essa singela explicação e muito mais pela reverência que faremos ao grande mestre, Antenor Nascentes, autor dessa nomenclatura, meu professor na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (na época UDF), com quem troquei, alguns anos depois de formado, correspondências, inclusive sobre esse fenômeno do POSVÉRBIO, discutindo, ainda, temas linguísticos variadíssimos, muitos reunidos depois, no livro escrito por quatro professores do Instituto de Educação do Estado do Rio de Janeiro, “Português para o Curso Normal”, Rio de Janeiro, 1967, .... tendo sido aprovado, com louvor, por este grande filólogo, etimólogo, dialectólogo e lexicógrafo brasileiro.

ATÉ A PRÓXIMA                    

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Balneário Camboriú, Sul/Santa Catarina, Brazil
Sou professor adjunto aposentado da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sou formado em Letras Clássicas pela UERJ. Pertenço à Academia Brasileira de Filologia (ABRAFIL), Cadeira Nº 28.