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23 de outubro de 2015

O POETA, UM MELANCÓLICO



“Como é incoerente este mundo,

pois a alegria completa

e o sofrimento profundo

se unem e formam o poeta”.


POETA vem do grego “poietés” e significa o que faz; o autor. Chegou até nós pelo latim poeta. Desde os tempos de Heródoto e Píndaro significa o que faz versos.



Michel Jules Alfred Bréal, linguista francês, considerado o fundador da semântica moderna, em seu célebre livro Essai de sémantique, assim nos diz sobre aquele que  faz versos:

          
 “On croit communément que le poète, aux yeux des Grecs, était “le créatur”, et le poème “ume creation”. Mais la réalité est un peu différente"...  

Contudo, deixando a semântica no seu lugar nominativo e voltando para a produção, isto é, para a "creation", parece que o poeta é um melancólico, inscrito no erotismo de todas as visões: a antiguidade clássica, o período quinhentista e o período modernista neo-hegeliano. O poietés, o poeta grego, sujeito de seu discurso, a poiesis pós Heródoto, existe como melancólico, bem antes da era psicanalítica. O poeta é o sujeito sobre o qual recaiu a sina do mito tebano. Antônio Sérgio Mendonça diria: “o que quisera não ter nascido com tal destino”.

Nos textos camonianos, por exemplo, o poeta canta a fragilidade da vida e a fugacidade do mundo e da vida, num lírico devaneio conflitual entre morte e vida, internalizando o luto.

O poeta barroco, mesmo o da tradição alemã com tendências românticas, também se envolve na melancolia freudiana, embora se aproxime do bovarismo e da paixão.

O poeta realista de modelo machadiano irá articular melancolia com o riso, não como amor e dor, tradição freudiana, mas como fenda na articulação social. Mas outras vertentes atingem o realismo poético diferentemente, articulando gozo e dor.

O poeta romântico poderá ser visto como melancólico inveterado, como Jean Alluch colocará, no dizer ainda de Antônio Sérgio Mendonça, “no choro constante da carpideira como perenidade do estado melancólico crônico”, romântico, por conseguinte.

O poeta do moderno e do pós-moderno estrutura-se (ou desestrutura-se) entre Nephentée, um simulacro de Afrodite materializada em Helena e a “acedia”, desestruturando, também, a cultura, envolvendo-a na mortalha da morte.

Portanto, se POETA é o agente, o que faz, será poeta, quem fez? Já a melancolia, contida na escritura, seria para Freud um juízo de existência, mas para isso, tal escritura terá de ser considerado verso. Será?

Dispensa-se o “RISUM TENEATIS” de Horácio.  


ATÉ A PRÓXIMA








18 de setembro de 2015

BRASIL X SUÉCIA, UM DERBY GEOPOLÍTICO





 Meu amigo e afilhado, Mário Leo, um rapaz de bom papo e muito inteligente me mandou, pelo Facebook, uma  notícia sobre a Suécia, nas palavras de um bem intencionado jovem. Dizia o gajo que a Suécia iria fechar as penitenciárias por falta de criminosos. Que maravilha! Aqui, se isso acontecesse o Comando Vermelho, certamente, entraria em greve e seria um caos total nas polícias do Rio e de São Paulo, pois os nossos bravos PMs ficariam sem atividade e isso iria mexer profundamente com toda as duas maiores cidades do Brasil, por motivos óbvios...Tudo bem, mas a história da Suécia é outra. É, também, um país muito pequeno. Frio. Gelado, mesmo. Não dá vontade de se fazer arruaças nas ruas.... Não teve escravidão. É verdade que sempre investiu em educação. Por isso, por ser pequena e por ter um povo mais calejado, através de sua história de lutas, tem mesmo é de ser diferente, com um povo também diferente. Lá, nas frígidas terras do Círculo Polar Ártico, a educação foi privilegiada numa sequência de governos sérios, responsáveis, honestos e inteligentes. É bom dizer também que a monarquia ajuda a manter a autoestima do povo, que se sente sempre com o rei na barriga... Agora, quero ver a Suécia vir para os trópicos e ter uma superpopulação, com mar azul, sol, sal, cerveja e areia dourada! Corpos morenos rebolando nas praias desses mares do sul (corpos femininos, é claro!). Mudaria tudo, né? Concordo com o rapazinho de barbicha que tecia loas à Suécia, mas não acho que aquele país seja modelo histórico para o Brasil. Aliás, não existem modelos históricos, não é Karl Marx? Modelo para o Brasil poderia ser, talvez, todavia, contudo, pensando rapidamente, a Austrália, que foi colonizada por bandidos, mas herdou a força impetuosa do trabalho dos homens sérios que por lá tentaram e conseguiram organizar o caos. Bem, geopolítica é uma ciência social e não se pode ficar querendo que um país seja isso ou aquilo, baseado em modelos fixos ou em utopias. Que o Brasil precisa, em primeiro lugar, se livrar desses governantes atuais, não resta dúvida. Que, em segundo lugar, deve investir maciça e entusiasticamente em educação com projetos sérios e viáveis, planejados executados por governos sérios e confiáveis, não resta, também, a menor dúvida. Em terceiro lugar, temos de deixar de ser federação e passarmos a confederação. Perdemos três bondes da história. Um macro espaço geográfico, com essa nossa história colonial esquisitinha, que profundamente nos marcou a todos, é quase impossível de ser governado, pois nessa imensidão de terras ainda há um povo muito desinformado, carente e o que é pior, viciado em conseguir as coisas de qualquer jeito. Ou melhor, com um fabuloso jeitinho. Caramba! Isso é papo para horas e horas, em um bom boteco, regado a muita cerveja, pois o verão se aproxima... Pronto, fiz a minha crônica do dia!  

ATÉ A PRÓXIMA

2 de setembro de 2015

A CULINÁRIA ESTÁ NA MODA







A culinária já foi tema de minhas crônicas no jornal O PROGRESSO DA FOZ, no qual colaboro há muitos anos e é dirigido pelo meu amigo, o competente jornalista, Joaquim Pinto da Silva. Ultimamente percebi que muitas pessoas conhecidas estão se transformando em gastrônomos amadores, pois nas festinhas, que sempre acontecem lá pelas bandas de Canto Grande, praia de Santa Catarina, o assunto é só comilança. Então, resolvi voltar a falar sobre esse tema que está na moda. Nos bate-papos da última reunião de amigos mostrei aos interessados nas comidas exóticas ou tradicionais que os cuidados com as receitas de iguarias já existiam em Portugal, pelo menos, desde o século XV. Todos ficaram interessados no assunto. É mesmo fascinante. Como sabemos a nacionalidade portuguesa, fundada por D. Afonso Henriques, data do século XII. Logo, o que vou falar aos amigos, apreciadores da boa e farta mesa, foi escrito 300 anos depois da fundação do Condado Portocalense, que se notificou por suas gloriosas histórias de lágrimas, amor e sangue e, porque não dizer, também, de muita banha, bolinhos, assados e crocantes. Portanto, de um documento histórico de seis séculos retirei uma receita.

Vejam o título:

 A impressão inicial é de total confusão. Letras amontoadas, brigando umas com as outras. Não dá para se entender quase nada, mas especialistas em ecdótica, como o Pe. Augusto Magne e A. G. Cunha, entre tantos outros doutos filólogos brasileiros apresentaram-nos leituras diplomáticas e modernas desse e de muitos outros pergaminhos medievais, num trabalho minucioso de crítica textual. Este, cujo título é uma iguaria formidável, chegou até nós e mostra a vida de então pulsando nas cozinhas dos castelos, dos mosteiros, das vilas, das casas simples dos campos e das fazendas, e em muitos sítios daquela época quinhentista, fazendo-nos refletir sobre os momentos de requinte, mas também de aflição e angústia, talvez diante de tempos de escassez. Tempos, meus amigos, talvez vividos gente igual a nós, com os mesmos anseios, tentando encontrar na cozinha a satisfação da degustação, como supremo encantamento de vida. Pode-se acreditar que procuravam a todo instante, entre temperos, caldos, pastas e água fervente, articular o pensamento, porque, segundo afirma Claude Lévi-Strauss, em seu livro Le cru et le cuit, o homem não cozinha para comer e sim para pensar...
Este pedaço de manuscrito é fantástico porque guarda interessante material filológico, como os termos "albarada" e "sartãa" ou "sertãa", que equivalem hoje a saco-de-confeitar (aqueles com bicos para decorar bolos) e frigideira, respectivamente. Mostra, ainda, a vida girando em torno do forno e do fogão, chegando a nós através de desenhos que mais parecem rabiscos em caracteres arábicos ou garranchos feitos por iniciantes na alfabetização. Trata-se de um texto medieval, retirado da obra editada pelo Instituto Nacional do Livro, do MEC, em 1963, intitulada UM TRATADO DA COZINHA PORTUGUESA DO SÉCULO XV, cuja edição foi preparada pelo professor Antônio Gomes Filho. Bem, agora pergunto. Descobriram qual é a receita que o título indica? Acertou quem disse PASTÉIS DE CARNE.
Parabéns para quem acertou, mas eu vou correndo para um barzinho, à beira mar, aproveitar a sugestão e degustar essa iguaria de mais de quinhentos anos, com um chopinho estupidamente gelado, porque ninguém é de ferro!

ATÉ A PRÓXIMA
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Quem sou eu

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Balneário Camboriú, Sul/Santa Catarina, Brazil
Sou professor adjunto aposentado da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sou formado em Letras Clássicas pela UERJ. Pertenço à Academia Brasileira de Filologia (ABRAFIL), Cadeira Nº 28.